Resenha do livro “Blink – a decisão num piscar de olhos” de Malcolm Gladwell

Esse post faz parte da seção Convidados e tem autoria de Laís Cenbrone.

Na obra “Blink – A decisão num piscar de olhos“, o autor Malcolm Gladwell, com base em diversos estudos e pesquisas, nos apresenta o poder da intuição, nos colocando logo na introdução que Blink é um livro a respeito dos nossos dois primeiros segundos de exame de qualquer situação.

Blink está repleto de histórias: nos apresenta, logo de início, o caso da escultura kouros, no qual o Museu Getty pagou para especialistas a analisarem cuidadosamente durante catorze meses para atestar sua veracidade, ao posto que nos primeiros segundos diante da escultura, um expert em arte logo intuiu que esta era falsa: fato este que, no momento em que ocorreu, não poderia ser explicado de forma consciente.

A respeito de tal consideração, o autor pontua que o livro possui três tarefas, sendo a primeira delas convencer-nos de que decisões tomadas muito depressa podem ser tão boas quanto decisões tomadas de forma cautelosa e deliberada; a segunda, responder ao dilema de: quando devemos confiar em nossos instintos e quando devemos nos precaver em relação às conclusões precipitadas?; e, como terceiro e principal objetivo, convencer os leitores de que suas conclusões rápidas e seus julgamentos baseados na primeira impressão podem ser controlados e aperfeiçoados.

Segundo o autor, possuímos um inconsciente adaptável, que corresponde a uma parte de nosso cérebro responsável por chegar rapidamente a diversos tipos de conclusão, pois processa de forma rápida e silenciosa um grande número de dados em pouquíssimo tempo: nosso computador interno.

Ao longo de seis capítulos, cada um trazendo aspectos muito interessantes acerca de tais estudos, Gladwell nos convence da máxima popularmente conhecida que diz “pensar demais, atrapalha“. O autor nos apresenta diversos casos onde o excesso de informação sobre determinada situação influencia negativamente o nosso julgamento, em detrimento da ‘intuição’ que tivemos logo no início da mesma.

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No primeiro capítulo, nos deparamos com situações que variam da observação de quinze minutos de conversa entre um casal por um psicólogo que poderá prever se estes irão se separar ou não, a um estudo de personalidade que compara a taxa de acertos entre pessoas que conversaram pessoalmente com os estudantes analisados e outras que apenas observaram seus respectivos quartos de dormir. O autor intitula este capítulo inicial como “A teoria das fatias finas“, e a esse respeito discorre dizendo que:

“A capacidade de fatiar fino não é um dom divino: é uma parte fundamental da estrutura humana. Nós costumamos fatiar fino sempre que conhecemos uma pessoa, quando conseguimos entender algo rapidamente, ou quando nos defrontamos com uma situação nova. Nós fatiamos fino porque somos obrigados a fazê-lo, e aprendemos a ter confiança nesta habilidade porque existem muitas ameaças no mundo exterior, e porque existem diversas situações em que o exame detalhado dos dados obtidos com o ato de fatiar fino pode nos fornecer informações valiosas, ainda que em questão de dois ou três segundos.”

No terceiro capítulo, “O erro de Warren Harding”, Gladwell começa a discutir a tarefa número dois de seu livro, abordando o lado sombrio da cognição rápida. Crer nas primeiras impressões e no fatiar fino é acreditar que podemos saber mais sobre alguém em instantes do que em demorados estudos, e neste aspecto precisamos abordar o preconceito e discriminação que estão na origem de muitas destas ‘intuições’.

Ao trazer diversos exemplos de casos do uso do Teste de Associação Implítica (IAT), uma ferramenta que examina de perto o papel de associações inconscientes em nossas crenças e em nosso comportamento, fica claro o poder de atuação de nosso inconsciente em questões importantíssimas e sobre as quais erroneamente cremos que estamos conscientes. Gladwell pontua que:

“Não escolhemos deliberadamente nossas atitudes inconscientes. E como escrevi no primeiro capítulo, podemos nem mesmo estar cientes delas. O computador gigante que é nosso cérebro digere silenciosamente todos os dados das experiências que tivemos, das pessoas que conhecemos, das lições que aprendemos, dos livros que lemos, dos filmes que assistimos e assim por diante, e forma sua opinião. É isso que forma o IAT.”

O autor finaliza tal colocação dizendo que o aspecto mais perturbador disto é que, muitas vezes, as atitudes inconscientes podem ser completamente contrárias aos nossos valores conscientes.

No decorrer do livro vemos diversos exemplos de situações onde a discriminação e padrões culturais imperavam (e ainda imperam), como o caso da orquestra que só passou a contratar mulheres quando realizou os testes sem saber quem estava tocando, ou a questão da altura dos homens (brancos, obviamente) que chegam ao posto de CEO, ou mesmo candidatos negros serem preteridos em entrevistas com base em julgamentos estritamente preconceituosos (conscientes ou não).

Gladwell retoma a questão dos produtos em “O dilema de Kenna”, onde discute a suposta eficácia de pesquisas de mercado e grupos de foco, pois ao perguntamos às pessoas o que elas querem, levando em consideração que muitas vezes as decisões de compra são tomadas num nível inconsciente, não obteremos respostas fidedignas, como no tão discutido caso da pesquisa envolvendo a Pepsi e a Coca Cola; e não apenas neste, mas também no exemplo do músico Kenna e as diversas recusas que obteve das gravadoras, e da inovadora e confortável cadeira Aeron.

Já próximo à finalização do volume, temos o chocante caso do assassinato de Diallo por policiais no Bronx, no qual um homem desarmado foi baleado com quarenta e um tiros por um ‘erro de julgamento’; caso este que, infelizmente, vemos repetido à exaustão em periferias brasileiras. É discutida a necessidade de treinamento especializado para profissionais com tal responsabilidade e poder, mas sabemos que a questão vai muito além disso. Basear importantes decisões na primeira impressão, ainda que esta seja uma realidade incontestável e ninguém esteja imune a tal comportamento, é extremamente complicado e perigoso em uma sociedade tão desigual e lotada de preconceitos. A necessidade de nos tornamos cientes a respeito de tais questões, e de trazermos para o nível da consciência tais julgamentos automáticos e muitas vezes equivocados, é urgente.

Como dito pelo autor, o nosso cérebro processa rapidamente todos os dados e memórias com que o nutrimos durante toda a nossa vida, se baseando nos filmes que vimos e nos livros que lemos, o que somente reforça ser imprescindível a luta das minorias por representatividade e a incessante batalha para vencer tantas ‘intuições’ e ‘primeiras impressões’ negativamente carregadas por séculos de preconceito declarado em todas as instâncias. É realmente necessária uma audição às cegas para que uma mulher seja contratada por uma orquestra? Na página 243, Gladwell coloca que: “Levar a sério nossos poderes de cognição rápida significa que precisamos reconhecer as sutis influências que podem alterar, prejudicar ou desviar os produtos do nosso inconsciente“.

Em uma análise geral, Blink nos sugere importantes reflexões, colocando no foco da discussão questões do dia a dia que geralmente passam despercebidas e influem não somente em decisões pequenas, como a compra de um produto, mas também em situações de tensão e muitas vezes de perigo, como o caso do Bronx. Nos tornarmos conscientes, treinando e problematizando constantemente a primeira impressão que temos acerca das coisas, nos permitirá tomar decisões mais acertadas e, quem sabe, um dia sermos capazes de decidir determinadas ações ‘em um piscar de olhos’.

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